A NeuroArquitetura e os Desafios da Arquitetura Hospitalar - parte I
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A NeuroArquitetura e os Desafios da Arquitetura Hospitalar - parte I


Por Andréa de Paiva


Qual é o papel da arquitetura em um edifício hospitalar? Criar ambientes que estimulem a produtividade dos médicos? Criar ambientes que estimulem a recuperação e o bem estar dos pacientes? Criar ambientes que estimulem a geração de lucros para os hospitais, incentivando a desocupação dos quartos e o consumo nos cafés? Será que todos esses objetivos estão sempre alinhados? A resposta é: nem sempre.


Hospital
Imagem de Domínio Público

O hospital é um ambiente no qual se defrontam interesses potencialmente conflitantes. Por isso, missão dos arquitetos é tão relevante. Assim, a experiência mostra que um espaço concebido para estimular a atenção dos médicos pode não favorecer o interesse mais imediato dos pacientes, que é o repouso e a recuperação. Por outro lado, as atividades de hotelaria, cada vez mais importantes na atividade hospitalar, podem ser muito diferentes dos serviços propriamente ligados à saúde, o que gera requisitos também distintos em termos de soluções de arquitetura. Portanto, o desafio dos arquitetos é procurar balancear essa equação levando em conta todo um conjunto de necessidades relativas a usuários e profissionais que fazem, cada um deles, um uso muito próprio do espaço construído [1].


Tendo em vista que o objetivo-síntese da atividade hospitalar é o tratamento e a recuperação adequada de pacientes, conhecimentos de neurociência aplicada à arquitetura são fundamentais para uma arquitetura hospitalar equilibrada. Não se trata de conceber ambientes esteticamente agradáveis simplesmente, mas sim funcionais, com foco no bem-estar humano. Mantendo isso em mente, a NeuroArquitetura pode ajudar a atender às necessidades dos diversos stakeholders, gerando um edifício muito mais eficiente.


Um caso clássico que ilustra os benefícios da NeuroArquitetura para hospitais são as UTIs neo-natal. Até alguns anos atrás, os arquitetos projetavam UTIs que priorizavam o trabalho de enfermeiros ao cuidar dos bebês. Por conta disso, dentre outros elementos, a iluminação tinha que ser bastante eficiente para que qualquer alteração nos recém-nascidos fosse rapidamente identificada. Os bebês, porém, tinham outras necessidades. Por exemplo, receber estímulos adequados para que áreas do cérebro responsáveis pela visão e audição se desenvolvessem corretamente. Esse era um ponto de conflito potencial muito relevante. Até o início da fase adulta, o desenvolvimento do cérebro é marcado por diversas janelas associadas a funções específicas como o equilíbrio, a fala e a audição, dentre outras. A falta de estímulos adequados durante essas janelas pode comprometer de forma permanente o desenvolvimento de habilidades sensoriais e cognitivas. No período recente, com o auxílio da NeuroArquitetura, esse conflito potencial tem sido reconhecido e os projetos de UTIs neo-natal mudaram radicalmente [2]. E, por conta disso, as necessidades de estímulo dos bebês têm sido consideradas conjuntamente às demandas funcionais de médicos e enfermeiros .

Mas o grande desafio da arquitetura de hospitais continua sendo o grande trânsito de pessoas e sua diversidade. O próprio universo dos pacientes é constituído de vários subgrupos, como recém-nascidos, idosos, gestantes etc. Mais ainda, os interesses de cada um desses grupos podem variar dependendo da razão da internação e do tratamento a ser oferecido: pacientes da oncologia, gestantes, portadores de Alzheimer, pacientes com deficiências físicas ou doenças contagiosas etc. Assim como os cuidados que cada grupo e cada condição exigem são específicos, de certa forma, o espaço dedicado a eles também se caracteriza por diferentes funcionalidades. E isso vale não apenas paras os chamados hospitais gerais, como também para os hospitais especializados, ainda que em menor grau.

Do mesmo modo, os interesses e necessidades dos médicos e enfermeiros variam muito. Durante uma cirurgia, o médico precisa conseguir se concentrar e, ao mesmo tempo, se comunicar com seus assistentes; ao conversar sobre diagnósticos e tratamentos com os pacientes e seus familiares, o ambiente deve favorecer a sensação de privacidade para que os pacientes possam se sentir seguros e responder com sinceridade às perguntas do médico; durante as pausas para descanso, é fundamental que os médicos consigam repousar e relaxar ao máximo para voltar ao trabalho recuperados.


Em meio a tamanha diversidade e potenciais conflitos, o arquiteto também deve estar atento aos interesses comuns aos diversos grupos, como gerar um ambiente que contribua com a localização especial de profissionais, pacientes e familiares. Especificamente no campo na NeuroAquitetura, sabe-se da importância da biofilia, isto é, da influência favorável do contato com elementos da natureza, tanto para o desempenho dos médicos e enfermeiros como para a recuperação dos pacientes, tema que será melhor explorado em outros artigos desse site.


Tendo o bem-estar e a qualidade de vida dos usuários dos ambientes construídos como um princípio, a NeuroArquitetura oferece respostas a diversas das questões mais relevantes na concepção e no uso de estruturas hospitalares. Assim, fazendo uso da Neurociência aplicada, o Neuroarquiteto deve buscar reduzir os potenciais conflitos entre interesses e necessidades dos stakeholders e potencializar os elementos de convergência. Mas, para isso, é fundamental que arquitetos, neurocientistas e médicos unam forças na busca de conceber hospitais com espaços que atendam não apenas às necessidades operacionais e logísticas, mas também humanas e psicológicas de todos os envolvidos. Com isso, o foco na cura e recuperação dos pacientes passa a assumir uma nova dimensão, física e psíquica, com forte conteúdo interdisciplinar. Além dos assistentes tradicionais, como enfermeiros, instrumentadores e anestesistas, cirurgiões e clínicos terão nos arquitetos grandes aliados em favor dos pacientes.


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Referências:


[2] EBERHARD, J. (2008) Brain Landscape The Coexistence of Neuroscience and Architecture. Cary: Oxford University Press. ISBN: 9780195331721


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